VALOR ECONOMICO, 11/11/2010
Dani D'Ambrosio
Os investidores estrangeiros estão interessados em investir no Brasil. Mas a rápida reação do mercado imobiliário pós-crise trouxe pelo menos duas consequências antagônicas. De um lado, um crescimento inconteste e uma vastidão de oportunidades. De outro, uma série de dúvidas sobre a vulnerabilidade do setor. Apesar do franco interesse e até da cobrança de vir para o Brasil ou aumentar os investimentos aqui - para os que já estão - os investidores começam a se questionar se o país ainda pode garantir os retornos desejados, depois da forte alta dos preços. Outras duas grandes preocupações: como ficará a fonte de recursos para abastecer o mercado imobiliário após o esgotamento da poupança e como serão resolvidas as questões operacionais: o nível de atividade vai acompanhar o volume de investimentos?
Ontem, um grupo de investidores, representantes de empresas do setor e bancos estiveram reunidos na Conferência do Global Real Estate Institute, que organiza debates em diferentes partes do mundo. O mercado mudou e todos envolvidos estão cientes disso. Antes se falava em retornos anuais de 20% a 25%. Hoje já se fala em 15%, exagerando 18%. O volume de empresas interessadas em investir está quase empatando com os que desenvolvem os negócios.
Uma constatação clara: a maior parte dos nós passa pelo governo. É ele quem vai ter de resolver que alternativa dará quando acabar os recursos da poupança. Trata-se de uma questão regulatória. É também o governo, no nível das prefeituras, quem tem que agilizar, através de uma estrutura maior, a aprovação dos projetos, que hoje levam mais tempo para ser aprovados. A falta de infraestrutura - outra grande preocupação, principalmente de quem quer colocar recursos em projetos de baixa renda - também depende da esfera governamental. "A demora na aprovação de projetos já tem implicação no custo de carregamento e nas taxas de retorno", diz Bruno Laskowisky, presidente da WTorre Properties.
Outro consenso. Não existe bolha imobiliária, apesar da elevação dos preços. O neologismo para traduzir o que acontece hoje no mercado imobiliário: reprecificação dos ativos. Os imóveis atingiram novo patamar de preços, mais próximos de outros países. "Não é bolha porque no mercado residencial, as pessoas compram para morar", diz Axel Chaves, diretor do fundo Paladin, há 12 anos no Brasil. "A oferta é muito menor que a demanda porque não se consegue dar fluxo na aprovação dos projetos e por isso os preços sobem", diz Walter Cardoso, presidente da consultoria Richard Ellis.
Mas o atual nível de preços preocupa, é fato. Ramsey Tadros, da Westfields Consultoria Empresarial, que representa o fundo Carlyle no Brasil (que desistiu de investir no mercado imobiliário brasileiro no auge da crise e não voltou mais) é conservador e cauteloso. Na sua opinião, o mercado imobiliário está muito aquecido e é preciso tomar cuidado antes de investir aqui. "Há uma onda de excesso de valor, é preciso pagar certo pelo projeto certo." Para Tadros, no momento atual do mercado imobiliário, o investidor estrangeiro precisa avaliar que não se trata da gestão de ativos, mas da gestão de risco.
A questão do fim os recursos da poupança também permeou vários debates. Luiz França, diretor de Real Estate do Itau Unibanco disse que, nos próximos dois anos, os recursos da poupança não serão suficientes. "É uma bomba relógio prestes a estourar." Trata-se de um dinheiro subsidiado, referenciado em TR, que traz prestação muito baixa, que dá acesso ao comprador de baixa renda - que é a mola propulsora do setor.
Uma mudança importante: o negócio imobiliário era familiar e agora não só teve acesso ao mercado de capitais, como também ao assédio direto dos investidores estrangeiros. Se as empresas precisam do capital dos investidores para crescer - já que há poucos recursos disponíveis para as menores e fechadas, principalmente - esses, por sua vez, mostram uma preocupação enorme em acertar nas parcerias. Querem selecionar o parceiro certo, que traga as melhores oportunidades e saiba resolver as questões burocráticas da melhor forma possível. "Quando vamos para fora, o ponto-chave são as pessoas, perdemos mais tempo procurando as pessoas certas do que analisando números", disse James Rehlaender, da European Investors, que não tem negócio no Brasil.
A importância de fazer o "casamento" ideal é tanto de quem ainda está namorando, quanto de quem já achou o parceiro. Axel Chaves, diretor do fundo Paladin que está há 12 anos no Brasil, tem participação na construtora Even, You, Inc e é majoritário na Inpar, acredita que para ter sucesso no mercado brasileiro, a melhor forma de atuação são as parcerias, de preferência nos projetos. "Nosso trabalho está em identificar um parceiro que seja capaz de identificar os melhores negócios", diz.
Os fundamentos brasileiros ainda falam mais alto que os problemas na hora de investir. "Não há uma resposta científica para saber o prêmio de rentabilidade no Brasil, mas há fundamentos sólidos, como o déficit habitacional e a questão demográfica, e se tiver o crescimento suficiente, como mostra que está tendo, o dinheiro volta ", afirmou Scott Koenig, diretor da RREEF, braço do Deutsch Bank para a área imobiliária, responsável pela gestão de US$ 15 bilhões em ativos. A empresa não tem investimentos no Brasil, mas está analisando oportunidades. "Não queremos entrar tarde demais no jogo, mas queremos investir no Brasil de maneira correta, com um parceiro adequado."
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PAÍS ATRAI INVESTIDORES ESTRANGEIROS E SURGEM OFERTAS DE NOVOS SERVIÇOS
O aquecimento do mercado imobiliário tem atraído investidores do exterior e contribuído para o surgimento de novos produtos e serviços. Em 2007, o empresário alemão Raphael Rottgen resolveu deixar o trabalho em um grande banco de investimentos em Londres e dar vazão ao seu lado empreendedor. Tinha a ideia de investir dinheiro em um negócio na área imobiliária em um país emergente, em que as condições de crescimento fossem muito mais atraentes do que nas nações desenvolvidas, que já sofriam com os problemas do refinanciamento de hipotecas.
Pegou as malas e embarcou para Rússia, China, Índia, África do Sul, Emirados Árabes e Brasil. Depois da longa pesquisa pessoal feita nesses seis países, resolveu apostar suas fichas, em dezembro de 2007, em São Paulo, com o projeto de uma consultoria de crédito imobiliário. O negócio começou a ser desenhado no fim de 2007, mas se tornou operacional no fim de 2009. Dois anos foram consumidos na elaboração do desenho do negócio, criação do site e treinamento dos funcionários. Com escritórios em São Paulo e Rio de Janeiro, a empresa prevê faturar entre R$ 1 milhão a R$ 5 milhões neste seu primeiro ano, diz Rottgen, presidente e principal sócio da Sagace, que não revela nenhuma meta de desempenho futuro da consultoria.
"O Brasil tem um mercado muito promissor, e as operações começam a ficar complexas. Isso exigirá a figura de um consultor que analise empréstimos e financiamentos e identifique qual o produto mais adequado ao cliente, além de também ajudar no processo de concessão do crédito", diz Rottgen. Há dez anos, poucos bancos atuavam com crédito imobiliário. Hoje, as instituições disputam espaço e contam com a concorrência de agentes financeiros focados em financiamento imobiliário ou em refinanciamento a imóveis.
A Sagace tem entre 1.200 a 1.500 processos de financiamento, sendo a maioria de pessoas físicas, e irá buscar ampliar esses números e sua capilaridade no país. Em 2011, a empresa irá abrir escritórios na região Sul, em Curitiba ou Porto Alegre, um no Centro-Oeste, provavelmente em Brasília, e três nas regiões Norte e Nordeste, provavelmente em Salvador, Recife e Manaus. Em países desenvolvidos, os serviços de consultoria de financiamento imobiliário chegam a ter participação superior a 50% do total de contratos de crédito fechados no mercado. No Brasil, esse nicho ainda é praticamente virgem.
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