segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Choque de ordem' põe dezenas de trabalhadores no olho da rua

Choque de ordem' põe dezenas de trabalhadores no olho da rua
Patrick Granja
No mês de março, os tratores do 'choque de ordem' atacaram nas favelas do Rio, deixando dezenas de famílias sem ter para onde ir. Em duas operações, nos morros da Cotia e da Babilônia, 13 construções foram reduzidas a pó. Elas eram habitadas por um total de 93 pessoas, sendo 42 crianças e 14 idosos, que nem sequer foram avisados com antecedência e tiveram que ir para os obscuros abrigos da prefeitura. E não pára por aí. No final de fevereiro, em Madureira, os cães de guarda do 'choque de ordem' deflagraram o maior assalto aos camelôs desde o início do gerenciamento fascista de Eduardo Paes. Somente nesta ocasião, sete toneladas de mercadorias foram roubadas dos trabalhadores.

Cães de guarda da prefeitura assistem ao ataque do Choque de Ordem no morro da Cotia

No final do mês de fevereiro e início do mês de março, Eduardo Paes extravasou todo o seu ódio ao povo, intensificando as ações do 'choque de ordem'. Somente no morro da Babilônia, zona Sul da cidade, seis casas foram atropeladas pelos tratores da prefeitura, deixando dezenas de pessoas na rua da amargura. As famílias reclamam que não receberam sequer um aviso prévio e depositaram seu pouco dinheiro e suas maiores esperanças na nova moradia, reduzida a entulho por mais de 100 guardas municipais sob o comando do secretário de 'ordem' pública, Rodrigo Bethlem, braço direito de Eduardo Paes.

— Não tenho outro lugar para ir com o meu marido. Não quero ir para um abrigo. Também não é justo pagar aluguel, sendo que eu moro nessa casa há 12 anos — protestou ao jornal O Globo a dona de casa Fabiana Monteiro, que já morava no local com o marido e os quatro filhos.

A operação foi realizada no dia 10 de março pela manhã e recebeu total apoio da Unidade de Polícia Pacificadora, imposta aos moradores da favela em junho do ano passado pelo gerente estadual Sérgio Cabral.

Na operação que destruiu as casas de vários trabalhadores, Bethlem admitiu que "depois da inauguração da UPP nos morros do Chapéu Mangueira e Babilônia, o acesso da prefeitura para as ações da Seop nessas comunidades ficou mais fácil". Graças a essa facilidade, o canastrão prometeu demolir outras 10 casas no morro da Babilônia nos próximos meses.

— Tanta casa aí prestes a ser derrubada e ninguém faz nada. Gastei mais de 30 mil reais na minha. Íamos nos mudar daqui a três meses. Uma tragédia dessas sem nenhum aviso ou explicação — lamentou a balconista Betânia Ximenes.
"Vamos morar aonde?"

Uma semana antes, no morro da Cotia, às margens da estrada Grajaú-Jacarepaguá, outras sete moradias e um quiosque comercial foram perversamente atacados pelo 'choque de ordem'. A reportagem de AND esteve no local e conversou com um dos trabalhadores que perderam suas casas. Segundo o operário da construção civil Leandro Maciel, de 30 anos, os guardas e agentes, coordenados de perto por Rodrigo Bethlem, chegaram pela manhã intimidando os trabalhadores e retirando todos de dentro de casa.

— O choque de ordem chegou aqui 10h da manhã. Não avisaram ninguém antes e querem que a gente tire tudo de dentro de casa hoje. E as famílias que moram aqui, vão morar aonde? No total, além dos adultos e idosos, temos 27 crianças, mas não tem negociação. Disseram que vai todo mundo para abrigos e que vão levar as nossas coisas lá pra Ilha do Governador. Não deram nenhuma notificação, não avisaram nada antes. Tem gente que já mora aqui há mais de 20 anos. Eu moro aqui há 5 anos. Se avisassem, pelo menos a gente corria atrás de algum lugar decente para morar antes de ter que sair daqui. Eles já chegaram aqui intimidando a gente com o GAT (Grupo de Apoio Tático da PM) dizendo para todo mundo ficar quieto e não resistir. Ninguém está aqui para ser humilhado, somos todos trabalhadores — diz o operário, cercado por guardas municipais, com os cassetetes em punho.

Quando a equipe de AND chegou ao local, sob forte chuva, dezenas de pessoas — incluindo mulheres, crianças e idosos — observavam com muita tristeza suas casas sendo devastadas pelos tratores da prefeitura.

— A minha sensação é de muita revolta. A gente luta para ter uma moradia, por mais que seja um barraco e agora é humilhado, perde tudo e tem que ir pra um abrigo. E como vamos resistir, com um monte de criança no meio e esses PMs e guardas municipais querendo um motivo pra descer pancada em todo mundo? Eles já chegaram com arma de choque para intimidar. E não nos deram nenhum comprovante de nada, ainda disseram que nós é que vamos ter correr atrás de algum amparo — denuncia Leandro, muito revoltado, enquanto mais de cem homens da prefeitura destruíam sua casa à marretadas.

— Eu não voto mais em ninguém. Inclusive já rasguei meu título de eleitor. Eu tenho problema no pulmão e fico um dia inteiro no posto de saúde esperando para fazer apenas uma nebulização. Você compra remédio, você paga imposto, você compra um feijão e está pagando imposto e onde está sendo investido esse dinheiro? Na vida do povo que não é. Para pagar camarote para a Madonna assistir o carnaval, o Eduardo Paes tem dinheiro, mas para dar uma moradia e um emprego digno para a gente, não tem dinheiro. Muito pelo contrário, o dinheiro que é investido só serve para nos atacar, fazendo covardias como essa que você está vendo aí — protesta o operário.
"Se insistir, apanha"

Leandro conta também, que já fora atacado pelo 'choque de ordem' em várias outras ocasiões, quando fazia 'bico' de camelô para complementar a renda de sua família.

— Eu sou operário, mas quando não tem serviço eu vendo bebidas em torno do Maracanã para complementar a renda da minha família e já fui, por diversas vezes, reprimido pelo choque de ordem. Nessa operação têm guardas que já roubaram minha mercadoria em dia de jogo. Eu sempre me preocupo em vender no limite definido pela polícia, mas isso não os impede de nos atacar. Já chegam apontando armas e dizendo que se correr vão dar tiro na cara — conta Leandro, referindo-se ao apoio dado pela PM às ações criminosas do 'choque de ordem' no entorno do estádio Maracanã.

— Da última vez eu perdi mais de dez caixas de cerveja. Se é proibido cerveja, você poderia vender pelo menos uma água ou um refrigerante, mas não, nem isso eles deixam. E nós vamos fazer o quê? Eles têm armas e são ignorantes. Já me levaram carrinho, bicicleta, vários isopores, além da mercadoria e agora estão levando a minha casa. Na hora eles falam para ir ao portão 18 do Maracanã que vão nos dar o lacre e contar a mercadoria apreendida, mas quando você chega lá, já está tudo misturado e eles mandam você para casa. Se insistir apanha de cassetete. Isso tudo me revolta. Não tem emprego e mesmo assim a gente tenta sobreviver honestamente, mas nem assim temos paz. Você vai fazer o quê? Vai roubar? Se você roubar você está agindo errado e se você trabalhar também está agindo errado. Não temos mais o quê fazer — lastima o operário e camelô, desolado pela dura realidade imposta por este Estado parasitário, inimigo dos trabalhadores.

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