quinta-feira, 18 de setembro de 2008

A ESCASSEZ DO TALENTO

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Revista Indústria Brasileira, número 90A, Especial, agosto 2008

LIDERANÇA E GESTÃO

A ESCASSEZ DO TALENTO

O profissional empreendedor, inovador, capaz de implementar e suportar

mudanças ganha importância – e é cada vez mais difícil de encontrar

Por Fernanda Paraguassu

Ter os produtos que os consumidores querem, a um preço competitivo, exige das empresas a capacidade de desenvolver um novo perfil de profissional, tarefa que tem se mostrado das mais complicadas. No mundo corporativo, a expressão “apagão de talentos” virou jargão e os executivos buscam novas formas de gestão para atrair e reter competências em suas equipes.

Segundo o superintendente do iel nacional, Carlos Cavalcante, os executivos brasileiros sentem a necessidade de se preparar para serem mais competitivos, terem maior produtividade, melhores estratégias para tomadas de decisão e uma boa relação com funcionários e fornecedores. “É uma tendência que se intensificará nos próximos anos”, diz. Cavalcante destaca que a situação mais segura e estável do ambiente macroeconômico, tanto doméstico quanto internacional, dá condições para o empresário se concentrar no planejamento de médio e longo prazo. “Mas é necessário se capacitar.”

A preocupação do gestor de hoje deve ir além dos processos produtivos, porque isso não é mais suficiente para garantir bons resultados. Especialistas afirmam que, além de máquinas modernas, as empresas dependem de funcionários qualificados. Há casos de indústrias em que o trabalho tornou-se tão sofisticado que são encontrados apenas engenheiros no chão de fábrica. A nova realidade sem fronteiras, com a economia aberta, faz com que a competição possa estar em qualquer lugar do mundo. Portanto, alertam esses especialistas, além do preparo acadêmico, são necessárias outras habilidades, como uma visão global de seu negócio para permitir um posicionamento seguro em relação ao acesso a novos mercados e ao desenvolvimento de novos produtos.

Características como liderança, criatividade, espírito empreendedor, capacidade de adaptação e um nível de qualificação cada vez mais elevado para gerar produtos de qualidade são as mais procuradas em um profissional. “Produtos iguais viram commodities. Por isso, a inovação, seja de produtos ou processos, é fundamental para agregar valor”, afirma o coordenador do núcleo Vale de desenvolvimento de liderança da Fundação Dom Cabral, Anderson de Souza Sant’anna. Nos setores de telecomunicações, tecnologia, design e alta costura, por exemplo, que são considerados dinâmicos, a inovação tornou-se praticamente um fator de sobrevivência.

Segundo a professora da Brazilian Business School Neusa Hirota, como um modelo de negócios, projeto ou novo produto pode ser divulgado literalmente à velocidade da luz (pelas fibras ópticas das infovias), sua vantagem competitiva pode se perder

rapidamente. Assim, outros diferenciais menos “copiáveis” passam a ser os grandes ativos de uma empresa. “Diferenciais como empreendedorismo e agilidade de aprendizagem, ou seja, gente”, afirma.

No entanto, esses ativos, no perfil que o mercado exige, parecem estar em falta. Pesquisa feita pela Fundação Dom Cabral com executivos seniores do Brasil e do exterior mostrou que há carência de pessoas capazes de conduzir processos de mudanças e de suportá-las. As três principais preocupações apontadas por esses executivos foram: desenvolvimento de lideranças; gestão de competência; e atração e retenção de competência.

Sant’anna diz que há empresas com dificuldades para se internacionalizar por falta de líderes. “É preciso criar um contexto organizacional para facilitar a gestão”. Enquanto o gestor é definido como aquele que gera e processa dados, o líder tem de ser um desbravador. empresas que vão para a China, por exemplo, onde o contexto cultural e de negociação é totalmente diferente, precisam desenvolver processos adequados para aquele país.

O diretor-presidente da Eletro Aço Altona, Cacídio Girardi, que participou de um curso organizado pelo iel no insead de Cingapura, com visitas a empresas na China, concorda que é importante conhecer o país, o povo e sua cultura antes de iniciar um negócio. “Não adianta querermos atuar lá como fazemos no Brasil”, diz. A gerente de desenvolvimento de liderança da Votorantim Industrial, Neusa Hirota, diz que cabe às empresas buscar pessoas que entendam o “ser líder” não como um cargo, mas um estilo pessoal e natural que alavanque resultados e incremente competitividade. Devem ser líderes de fato e não por imposição organizacional, manter foco nos objetivos sem deixar de valorizar as pessoas. O líder do futuro equilibra aprendizagem permanente e mantém uma rede de relacionamentos com capilaridade, diversidade e densidade. “São esses quatro elementos (objetivos, pessoas, aprendizagem e relacionamentos) que permitem a um especialista migrar da competência técnica para posições cada vez mais estratégicas para geração de resultados”, afirma a executiva da Votorantim, quinto maior grupo privado brasileiro, com mais de 60 mil funcionários.

A gestão de competência significa a gestão desses novos perfis profissionais. Há uma necessidade de criar sistemas de reconhecimento e de recompensas diferenciados e um clima de engajamento maior entre os funcionários. Foi-se a época em que o chefe dava ordens e os empregados simplesmente as cumpriam. a nova geração de trabalhadores, destaca Sant’anna, tem valores diferentes. São pessoas que buscam maior equilíbrio entre vida pessoal e profissional e querem uma vida com sentido. Antigamente, trabalhava-se duro por uma remuneração financeira para consumir. Hoje os profissionais querem fazer parte do processo e esperam novos tipos de incentivos, vinculados aos resultados empresariais. “O mercado precisa de pessoas que lideram processos e competências e que ajudam organizações a se ajustarem melhor à construção de um novo paradigma de competitividade baseado na flexibilidade”, diz o coordenador da Fundação Dom Cabral.

É um movimento com origem semelhante ao observado em meados dos anos 1970, em que o mundo vivia a crise do petróleo e enfrentava a entrada de novos atores no mercado, sobretudo o Japão, reconstruído depois da guerra e competindo como grande potência. O aumento da inflação e, conseqüentemente, dos custos de produção, levaram a uma retração do consumo e as empresas tiveram que buscar novos processos produtivos e novas relações de trabalho. Desde então, lembra Sant’anna, vive-se um processo contínuo de rearranjos organizacionais.

Ao longo dos anos, saiu de cena o paradigma da rigidez, de trabalhos repetitivos, estrutura verticalizada e altamente hierarquizada e entraram organizações mais enxutas para responder de forma mais efetiva às transformações do ambiente. o lema passou a ser capacidade de adaptação e produtos diferenciados.

CAPITAL INTELECTUAL

A partir dos anos 2000, o capital intelectual ganhou muita importância. O movimento de flexibilização passou a demandar não apenas novas formas de organização, mas também de competências individuais. No entanto, a falta de profissionais com perfil inovador tornou-se um problema de nível mundial. Ao participar de um congresso sobre recursos humanos nos Estados Unidos, Sant’anna, da Fundação Dom Cabral, ouviu de um dos palestrantes que foi decretada a morte da lealdade. O argumento tomou como base uma pesquisa feita em 2003, nos Estados Unidos, em que 83% dos trabalhadores tinham extrema ou alguma probabilidade de mudar de emprego. No mesmo evento, Sant’anna também ouviu dos participantes a preocupação em relação à aposentadoria dos atuais executivos e líderes, que precisarão ser substituídos.

Segundo Neusa Hirota, países como Austrália e Canadá têm campanhas de imigração para estrangeiros calcadas na formação e na perspectiva da contribuição que possam dar. “Forçosamente, no futuro, o estímulo dessas nações grandes à imigração deverá aumentar”, diz Neusa. E isso terá reflexos no Brasil porque, além de encarar o desafio de melhorar o ensino, ainda há o risco de perder para os outros países aqueles profissionais que conseguem uma boa educação. “É um problema sério”, afirma.

Segundo o professor do insead James Teboul, as escolas e universidades também devem se adaptar à demanda por pessoas criativas. Teboul diz que o sistema tradicional preparava os estudantes para um mundo estável em que ficariam no mesmo emprego por anos. Agora os estudantes devem estar preparados para um mundo mais turbulento e desenvolver um enfoque mais artístico e emocional. Segundo o professor, o insead entende a globalização como uma forma de preparar estudantes e gestores para lidarem e se adaptarem a diferentes contextos econômicos, culturais e sociais, considerando a diversidade como uma fonte de aprendizagem, enriquecimento e de aproximação da comunidade internacional de negócios.

O insead oferece cursos para executivos brasileiros em parceria com o IEL nacional, que também organiza cursos na Wharton School, nos Estados Unidos. Cavalcante, superintendente do IEL, cujos núcleos regionais também oferecem serviços em gestão, afirma que o grau de fidelização em relação aos cursos de educação executiva da entidade é elevado.

Alguns executivos retornam em outros programas de outras escolas ou indicam o curso para outros dirigentes de sua empresa. “Esses cursos despertam os empresários para novas questões”, diz Cavalcante.

Teboul, do insead, destaca que as tendências na área de gestão no setor industrial são praticamente as mesmas das de outros setores. significa que o empresário deve ter uma visão global e também local, para oferecer um serviço melhor. Aliás, o serviço é, na visão de Teboul, a grande sacada para a diferenciação dos negócios, uma vez que todos os setores têm, de alguma forma, uma relação com o serviço. A tese está no livro Serviços em Cena (Campus, 200 páginas, R$ 47), lançado recentemente no Brasil. Para Teboul, internet e novas tecnologias continuarão a ter um papel-chave. “O líder sagaz deve se encarregar de implementar novas tecnologias e ser o seu próprio gestor”, afirma.

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