segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

“não entendo por que eles foram presos, todo mundo faz isso e não é punido”

http://institutodepesquisadasculturasnegras.blogspot.com/2010/01/universitarios-sao-presos-acusados-de.html

sexta-feira, 8 de janeiro de 2010
Universitários são presos acusados de racismo
FAÇA SUA PRÓPRIA REFLEXÃO
Futuros médicos brasileiros dizem: “não entendo por que eles foram presos, todo mundo faz isso e não é punido”; “foi apenas uma brincadeira de mau gosto”; “eles não fizeram nada demais, não roubaram, nem mataram”... Centro Universitário Barão de Mauá e
A "Justiça brasileira": juiz Ricardo Braga Montesserat os declara LIVRES!!!!!! Esse juiz também não fez nada demais!!!! " “não entenderia por que teria que prendê-los, corrigí-los, todo mundo faz isso e não é punido”; “foi apenas uma brincadeira de mau gosto”; “eles não fizeram nada demais, não roubaram, nem mataram”...

A vítima: O senhor Geraldo Garcia, trabalhador negro de serviços gerais, 55 anos, pai de quatro filhos e avô de três crianças, saiu cedo para o trabalho no último dia 12/12/2009 (sábado). De bicicleta, seguia por uma das principais avenidas da cidade de Ribeirão Preto, a Francisco Junqueira, num horário ainda de pouco movimento, por volta das seis horas da manhã. Como fazia todos os dias, seguia tranqüilo, aproveitando o percurso para pensar na família e fazer planos para o futuro. De repente, sentiu um golpe nas costas, que o lançou ao chão, ao mesmo tempo em que ouvia “Ô, seu negro”, “toma, seu negro”. Caído, correndo o risco de ser atropelado, ferido nas costas, nas mãos e nas pernas, ouviu gargalhadas eufóricas. Ao levantar o olhar, percebeu o carro preto que arrancava a toda velocidade. Sentiu-se impotente.



As testemunhas: Trabalhadores da área da segurança, que terminavam mais uma jornada, presenciaram o ocorrido. Viram quando o carro preto diminuiu a velocidade e um dos ocupantes, com a metade do corpo para fora, atingiu o senhor Geraldo Garcia violentamente, utilizando como arma um tapete de borracha enrolado, lançando-o ao chão. Ouviram os jovens manifestarem a sua única motivação de ódio - “toma, seu negro”. Ouviram seus gritos de euforia, enquanto o carro arrancava a toda velocidade. Indignaram-se. Entraram em um carro e saíram em busca dos criminosos. Conseguiram abordá-los algumas quadras depois, na avenida Nove de Julho, a caminho de uma das áreas mais valorizadas da cidade. Seguraram os rapazes até a polícia chegar.


A Polícia: O delegado Mauro Coraucci, após ouvir as testemunhas e a vítima, lavrou o flagrante de racismo, crime inafiançável e imprescritível. Num ato até surpreendente, pela prática das autoridades brasileiras em negar a existência do racismo, confirmou o crime, inclusive em entrevista para os meios de comunicação.


A Justiça: O Juiz Ricardo Braga Montesserat preferiu ignorar os depoimentos da vítima e das testemunhas. Liberou os jovens no mesmo dia, aceitando a tese da defesa de que não teria ocorrido um ato de racismo. Tendo desqualificado o crime, o juiz estabeleceu a fiança e, poucas horas após serem presos, os criminosos estavam livres.
Isso apenas reforça as pesquisas que comprovam ser a justiça brasileira cega para o racismo. Confirma o que parece já ser uma prática do judiciário nacional: descaracterizar o crime de racismo através de malabarismos legais, para suavizar a interpretação das práticas de discriminação racial, garantindo assim a possibilidade de pagamento de fiança e o abrandamento das penas dos racistas. É o racismo institucional, fruto de quase 500 anos de desumanização dos afro-descendentes, e que permeia as instituições nacionais, relegando as pessoas negras à subcidadania, negando-lhes direitos e dignidade.
Tanto é assim que se ouviam da boca de estudantes que acorreram à delegacia em solidariedade aos jovens criminosos frases indignadas do tipo “não entendo por que eles foram presos, todo mundo faz isso e não é punido”; “foi apenas uma brincadeira de mau gosto”; “eles não fizeram nada demais, não roubaram, nem mataram”; entre outras pérolas.
Agredir uma pessoa negra, por sua origem étnico-racial, só não é “nada demais” nas cabeças racistas de pessoas que não reconhecem a humanidade no outro, no diferente; somente é algo de somenos importância para as instituições que estas mesmas cabeças comandam.
Mataram sim, roubaram sim. O racismo brasileiro rouba e mata diariamente a dignidade, a humanidade e a auto-estima do povo negro brasileiro. Rouba e mata a nossa história e a nossa cultura. Provoca a morte de talentos e capacidades. E está provocando o extermínio da juventude negra nas periferias dos centros urbanos.


OS CRIMINOSOS
o goiano Abrahão Afiune Júnior, de 19 anos,
o paulista Felipe Grion Trevisani, de 21 anos e
o paraense Emílio Pechulo Ederson, de 20 anos.
Os três são estudantes de medicina do Centro Universitário Barão de Mauá, renomada escola particular de ensino superior de Ribeirão Preto, onde a mensalidade do curso de medicina é de R$3.800,00.
Jovens privilegiados, frutos reconhecíveis de uma sociedade hipócrita, que nega o racismo que pratica cotidianamente; de uma escola que silencia e/ou estereotipa a história e a cultura africana e afro-brasileira; e de instituições educacionais de nível superior que se recusam a incluir em seus currículos, conteúdos e disciplinas que tratem da educação das relações étnico-raciais. Assim, continuam a despejar no mercado de trabalho profissionais que desconhecem, não respeitam e até desprezam a diversidade étnico-racial brasileira. Esse desprezo é tamanho, que pode ser sentido pela população negra ao procurar atendimento médico, ao necessitar do sistema judiciário, nas abordagens policiais, ao assistir televisão, ao frequentar as escolas brasileiras...


Veja quem são eles acessando o link
http://maisband.band.com.br/v_43894_universitarios_sao_presos_acusados_de_racismo.htm


A AÇÃO DO MOVIMENTO NEGRO
Encontramos o senhor Geraldo Garcia indignado com a impunidade e com o descaso da justiça para com a violência de que fora vítima. Estava também com receio de atender o telefone e de fornecer seu endereço. Dele ouvimos “pensei que fosse um tiro nas costas. Sempre sofri com o racismo, xingamentos, mau atendimento nos lugares, mas nunca esperei por violência física. Eu estou muito assustado”.
O senhor Geraldo descreveu exatamente o que é o racismo brasileiro: “um tiro nas costas”.
Imediatamente deflagramos as ações necessárias para garantir-lhe suporte jurídico e psicológico. O caso está nas mãos da Comissão do Negro e Assuntos Antidiscriminatórios da OAB de Ribeirão Preto. Também estamos realizando manifestações de protesto e denúncia do ocorrido, e do racismo nacional.
A primeira manifestação, organizada pelo Centro Cultural Orùnmilá no dia 16/12/2009 (quarta-feira), na porta do Centro Universitário Barão de Mauá, onde os rapazes estudam, contou com a participação de diversos segmentos organizados da sociedade civil. O reitor entregou um documento de desagravo ao sr. Geraldo e ao Movimento Negro. Anunciou a suspensão dos criminosos por dois meses. Dois meses? Dezembro e janeiro? Mas trata-se do período de férias escolares no Brasil... Em coro os manifestantes exigiram: “expulsa os racistas, expulsa os racistas...”. Paulo César Pereira de Oliveira, ativista do Movimento Negro fez uso da palavra e cobrou um compromisso maior da instituição com a educação das relações étnico-raciais e com a implementação da Lei 10.639/03. Propôs de imediato que a Barão de Mauá inicie o ano letivo de 2010 com um seminário amplo, incluindo toda a comunidade escolar e a sociedade na discussão do racismo e da promoção da igualdade racial. A proposta foi aceita e nós cobraremos a sua concretização.
A segunda manifestação, convocada também por outros setores do movimento social, por sindicatos e partidos de esquerda, ocorreu no dia 19/12/2009 (sábado), na UGT (Memorial da Classe Operária), contou com a presença de várias lideranças da cidade, que demonstraram a sua indignação e comprometeram-se com a luta anti-racista.
Há quem diga que a luta do povo negro contra o racismo, pela vida, pela dignidade e por cidadania, faz aumentar o racismo. Na verdade, esta luta está fazendo os racistas “saírem da toca”, e explicitarem o seu ódio. Enquanto seus privilégios estavam intactos, contentavam-se em reforçar cotidianamente a ideologia racista que permeia o sistema educacional, a mídia, os processos seletivos no mercado de trabalho, entre outros. Mas nós estamos avançando sobre a cota 100% branca de cidadania e direitos. E isso eles não podem aceitar. Que queiramos ser mais que suas domésticas, amas-de-leite e motoristas, eles não podem aceitar. De norte a sul do Brasil, os racistas estão explicitando sua verdadeira face e o seu ódio. Enquanto isso as bases do governo federal negociam os nossos direitos com a base ruralista e com as elites racistas no Congresso Nacional. Enquanto isso, capitães-do-mato contemporâneos, disfarçados de setores do Movimento Negro, vendem a nossa luta, a nossa história, por migalhas que caem da mesa dos seus senhores.
Salve Dandara, salve Zumbi, salve todos e todas que tombaram lutando contra a escravidão e contra o racismo, e que nos inspiram a continuar nesta luta sem tréguas.
“Orùnmilá ati gbogbo okankanlerinnywo Irunmole awa gbe o”
(Orùnmilá e todas as 401 divindades nos protejam)

*Ativista do Movimento Negro / Centro Cultural Orùnmilá
Centro de Referência Negra Lélia Gonzales

“Eu não vou embora, e parece que vocês também não. Portanto, vamos simplesmente viver juntos.”
Socorrinha Coelhinha - 2009

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