O Globo, 25/6/2011
O MERCADO ESTÁ PARA GRINGO
Com crescimento da economia, investimentos estrangeiros em imóveis no país têm alta de até 150%
Paulo Justus
Mariana Durão
Eles não falam português, mas entendem muito bem a linguagem dos cifrões, milhões e polpudos percentuais de retorno. Cada vez mais estrangeiros vêm investindo no setor de imóveis brasileiro, atraídos pela forte expansão da economia. O volume de negociações nas imobiliárias disparou. Na Sotheby’s International Realty, braço imobiliário da casa de leilões inglesa, as vendas devem quadruplicar até o fim do ano, chegando a R$400 milhões no país. Já na Bamberg Imóveis o faturamento dos negócios com estrangeiros dobrou no ano passado, quando chegou a R$12 milhões, valor que deve novamente crescer 100% este ano. Especializada em imóveis de alto luxo, a Judice & Araujo (J&A) fechou R$25 milhões em vendas no Estado do Rio para clientes internacionais de janeiro a maio, alta de 150% sobre igual período de 2010.
O perfil é variado, e a moeda é o milhão: executivos que vêm morar no país a trabalho; residentes no exterior que passam poucos meses aqui e alugam os imóveis no resto do ano; e interessados em ganhar com a rentabilidade do aluguel ou revender as propriedades. Os valores negociados vão, em média, de R$1 milhão a R$4 milhões, mas a J&A cita negócios de até R$12 milhões. No Rio, a maioria busca os bairros de Leblon e Ipanema. Segundo o Secovi-Rio, o metro quadrado no Leblon vale hoje R$13.997, alta de 44,9% sobre junho de 2010. Na orla, o valor pode saltar a R$18 mil. O valor médio do metro quadrado para locação no bairro subiu 38% no último ano, chegando a R$52,33.
Segundo Michael Bamberg, presidente da Bamberg Imóveis, no Brasil a taxa de retorno média é de 12% ao ano, o dobro da Alemanha. Outro fator de atração é o preço ainda relativamente mais baixo, se comparado ao de outros países no mundo.
— Em Londres, um apartamento de classe média custa 15 mil o metro quadrado. Isso é mais que qualquer coisa no Brasil — diz João Crestana, presidente do Sindicato da Habitação de São Paulo (Secovi-SP).
Vagas para corretores que falem mandarim
Luigi Martins, diretor da Lopes Rio, avalia que o interesse dos estrangeiros pelo mercado imobiliário carioca foi impulsionado por notícias positivas nos últimos dois anos: UPPs, Copa 2014, Jogos 2016, pré-sal e os grandes investimentos governamentais conquistados a reboque.
Diante da procura, imobiliárias criaram setores específicos para atender aos estrangeiros e procuram contratar funcionários que, além do inglês, falem até mandarim. É o caso da Lopes Rio, onde o volume de chineses que batem à sua porta é crescente, reflexo da vinda de empresas como ZTE e Sinopec para terras cariocas. Na empresa, cada vez mais o atendimento on-line dá preferência a corretores que falem ao menos inglês ou espanhol.
Na J&A, ao todo 26 mil estrangeiros acessaram o site da empresa em busca de informações nos cinco primeiros meses do ano, a maioria franceses, americanos e ingleses. Nos últimos oito meses a China entrou no ranking dos cinco países que mais acessam a página. A participação desse púbico dobrou de 15% para 30% nos negócios da J&A, afiliada exclusiva da Christie’s Real State International no mercado fluminense desde 2007.
— Esse movimento já acontecia em 2007 e 2008, mas foi interrompido pela crise mundial. Agora voltou para ficar pelos próximos anos — avalia Frederico Judice Araujo, diretor de projetos da empresa.
Na Itaplan, o volume de vendas para estrangeiros neste ano deve chegar a R$150 milhões, o que representará um crescimento de 32% em relação a 2010. Esse valor sobe para R$300 milhões, se forem levados em conta os investimentos em incorporações e empreendimentos imobiliários, diz Fábio Rossi, diretor da Itaplan Imóveis e representante da Sotheby’s no Brasil.
Na Sotheby’s International Realty, especializada em imóveis de luxo, o Brasil é hoje o terceiro país mais consultado em seu site de vendas, atrás apenas de Estados Unidos e Inglaterra. Sotheby’s e Itaplan pretendem ampliar as operações para além de São Paulo, com a abertura de escritórios no Rio, no Nordeste e em Brasília este ano.
O presidente do Conselho de Administração da Associação para o Desenvolvimento Imobiliário e Turístico do Brasil (Adit Brasil), Felipe Cavalcanti, diz que, após a crise, os estrangeiros no país passaram a ser mais direcionados para Rio e São Paulo, nos segmentos comerciais e industriais. Antes, afirma, o Nordeste concentrava a maior parte do capital estrangeiro no setor imobiliário, com a aquisição da segunda residência de europeus.
— A crise atingiu o comprador europeu que buscava uma casa de verão no Brasil, ao mesmo tempo em que mostrou ao mercado internacional que o país passou bem pelo teste de estresse do sistema financeiro — diz.
Corretoras criam áreas internacionais
Algumas imobiliárias desenvolveram áreas específicas para o comprador de fora. A Coelho da Fonseca, por exemplo, criou no mês passado uma diretoria internacional voltada a assessoramento jurídico e financeiro a esses investidores. À frente da área, Gabriela Duva diz que o volume de atendimentos cresceu 35% de janeiro a junho deste ano, num total de 29 visitas a imóveis. Na Bamberg, o valor médio dos negócios gira em torno de R$10 milhões a R$15 milhões.
A J&A acaba de abrir uma área internacional. Além de atender aos clientes gringos e aos afiliados Christie’s no exterior, fará road shows para captar compradores. Os primeiros serão em agosto, em Nova York e Miami. Embora focada na comercialização de residenciais de luxo, a imobiliária negocia aquisições e consultoria a grupos estrangeiros interessados em adquirir terrenos para grandes empreendimentos imobiliários (de residenciais a resorts) no país. A perspectiva é que esses negócios se concretizem em 2012 e 2013, elevando a 50% a fatia dos estrangeiros nas vendas.
Morador de Ipanema há três anos, o inglês Jeff Both se define como um trader e diz que a contínua valorização dos imóveis no Rio dificultou seu trabalho:
— Compro imóveis comerciais que considero baratos, reformo e vendo assim que posso. Agora está mais complicado achar esses ativos, embora seja mais fácil vender. Vou ter que trabalhar duro — diz.
Both usa os serviços de consultoria da Sergio Castro Imóveis, que abriu em janeiro com parceiros belgas a Brioo. Com sede em Antuérpia, a consultoria tem como foco a venda de imóveis no Rio para grandes clientes europeus. Já intermediou quatro negócios com tíquete médio de R$15 milhões cada.
JURO MAIOR E LIQUIDEZ, FATORES A CONSIDERAR
Wagner Gomes
Lucianne Carneiro
SÃO PAULO e RIO. A decisão de investir hoje em imóveis deve levar em consideração fatores como a previsão de alta dos juros, que vai elevar o custo do crédito, e até a falta de liquidez, afirmam especialistas. Para o economista Ricardo José de Almeida, professor de finanças do Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper), os imóveis se valorizaram muito desde o início da queda das taxas de juros, em 2003, quando o volume de crédito aumentou e a procura cresceu. Mas ele acredita que a nova rodada de alta da taxa básica de juros leve o investidor de volta a aplicações de maior rentabilidade, ainda que com maior risco:
— A preocupação do governo com a inflação resultará em juros mais altos novamente. O crédito ficará caro e a parcela de financiamento do imóvel, maior, o que fará o preço cair.
Almeida ressalta que, para lucrar no mercado imobiliário, é preciso habilidade e conhecimento das leis, para, por exemplo, lidar com um inquilino inadimplente.
Já o professor de Finanças da PUC-SP Fábio Gallo não acredita que investir em imóveis seja uma boa opção para estrangeiros ou brasileiros, devido ao problema da liquidez:
— Ninguém consegue transformar um imóvel em dinheiro de um dia para o outro. Em São Paulo, por exemplo, você pode adquirir um apartamento caro e perder dinheiro se ao redor surgir uma favela.
Mauro Sérgio Oliveira, economista e diretor-presidente da Oliveira Trust — administradora de fundos imobiliários —, também aponta como dificuldades para investir em imóveis a recente alta de preços, principalmente em Rio e São Paulo.
— O mercado está muito aquecido. As pessoas veem conhecidos ganhando dinheiro e querem entrar. Mas é evidente que depois, de uma alta do porte que vimos, o investidor tem que ser cauteloso — diz Oliveira.
Ele ainda vê oportunidades de ganho nas regiões com menor valorização, como Centro e Zona Norte do Rio. Outro cuidado a ser tomado pelo investidor, ressalta, é evitar um financiamento com o IGP-M como indexador, que pode se tornar impagável se a inflação desacelerar.
Oliveira diz que o termômetro para avaliar o retorno do investimento é o aluguel mensal: este deve corresponder a 0,5% do preço do imóvel residencial e a 0,8% do comercial.
CORPO A CORPO
GARY GARRABRANT
A inflação vai subir, mas o valor dos imóveis vai acompanhar
SÃO PAULO. A valorização do real, a inflação e a recente valorização no preço dos imóveis, todos fatores que encarecem a entrada do capital estrangeiro no Brasil, não assustaram o presidente do fundo Equity International, Gary Garrabrant. Com o bilionário Sam Zell, Garrabrant criou o fundo, que tem hoje mais da metade de seus investimentos no setor imobiliário brasileiro.
O Brasil tem atraído a atenção de muitos novos investidores de fora. Como vocês veem isso?
GARY GARRABRANT: Estamos visitando o Brasil há mais de dez anos e começamos a investir no país há mais de cinco, com participação em companhias como BR Malls, Bracor e Gafisa. O nosso entusiasmo se mantém no mais alto nível para o Brasil. Estamos entrando num segundo capítulo em termos de estratégia no país, diferente do primeiro, em que procuramos grandes empresas nacionais. Agora, o foco são as parcerias regionais, com construtoras do ramo residencial.
Qual é o perfil de consumidor desejado para essa nova fase?
GARRABRANT: Estamos dando preferência a imóveis mais acessíveis e para a classe média, em todo o Brasil.
Como estão os investimentos em imóveis comerciais?
GARRABRANT: Nós temos uma forte posição na BR Malls e continuamos a buscar propriedades de varejo, tanto para shoppings quanto para alimentos. Há muitas opções de investimento.
Como o senhor vê a recente alta do câmbio e a valorização dos imóveis?
GARRABRANT: Por causa do nosso horizonte de longo prazo, estamos menos preocupados com a flutuação da moeda. O governo está monitorando não apenas o câmbio, mas a inflação e a taxa de juros, e nós estamos confiantes. Acho que os banqueiros no Brasil no setor privado têm nos dado conforto de que há condições de controlar isso. Com a inflação, nós também estamos dando preferência a prédios residenciais. A inflação vai subir, mas o valor dos imóveis vai acompanhar. Até agora, as margens de lucro permanecem constantes, apesar do aumento do custo da mão de obra e dos materiais. (Paulo Justus)
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