Extra, 15/6/08
VIDA NOVA
Trocando a favela pelo asfalto
Subsídios e crédito fácil levam moradores de comunidades carentes a trocar o aluguel por prestações da casa própria
Danielle Abreu
Vivian Pereira Nunes
Poder sair e chegar em casa a qualquer hora do dia. Esse era o sonho da doméstica Maria Aparecida Bento, 38 anos, que morava no Morro do Urubu, em Pilares, antes de comprar um imóvel retomado, com financiamento da Caixa Econômica Federal. Agora, ela paga R$ 270 mensais por uma casa de dois quartos, em Bangu, que custou R$ 24.800.
— Foi a oportunidade que vi para sair do pé do morro, onde tinha tiroteio o tempo todo. Fiz isso pela minha filha e hoje tenho um imóvel para deixar para ela — afirmou.
Aparecida integra um grupo, ainda tímido, que tomou a iniciativa de trocar o aluguel na favela pela prestação da casa própria no asfalto, um movimento que tanto a iniciativa privada quanto o governo apostam que está tomando impulso. Por dois motivos: mais acesso ao crédito pela população de menor renda e aumento dos subsídios para quem ganha até R$ 1.125 — somente este ano, foram aplicados 14,89% a mais do que no mesmo período de 2007.
Fortalecimento
Para o vice-presidente da Associação de Dirigentes de Empresas do Mercado Imobiliário (Ademi), Rubem Vasconcellos, a migração deve se fortalecer a partir de 2009. Hoje, cerca de um milhão de pessoas moram nas favelas da Região Metropolitana do Rio, segundo o IBGE.
Segundo a Ademi, o número de lançamentos com preço entre R$ 50 mil e R$ 100 mil, direcionados a essa parcela da população, teve crescimento de mais de 1.000% em três anos: em 2004, foram 48 unidades; em 2005, 140; em 2006, 178; e em 2007, 665.
O presidente da construtora Mudar, Augusto Martinez, acredita que um contingente cada vez maior de moradores de comunidades carentes vai perceber essa oportunidade do mercado imobiliário.
— É um caminho para os próximos 20, 30 anos.
PELA CASA PRÓPRIA, VALE ATÉ SORTEIO
Programa de arrendamento é opção para a baixa renda
Fugir da violência da favela do Muquiço, em Guadalupe, também era o maior desejo da auxiliar de serviços gerais, Manuela Elias de Carvalho, de 77 anos, que trabalha em um cartório no Centro do Rio. E ela conseguiu realizar esse objetivo há quatro anos, quando foi sorteada para morar num apartamento conjugado do Programa de Arrendamento Residencial (PAR), destinado a famílias com renda de até R$ 2.200, no condomínio da Senador Pompeu, no Centro. Inscrita no projeto desde 1996, Manuela paga hoje uma prestação mensal de R$ 164, em um financiamento de 15 anos.
— Eu já sou uma senhora. Não agüentava mais aquele tiroteio todos os dias. Não podia nem dormir. Agora, estou segura, e ainda moro mais perto do trabalho. Não preciso enfrentar engarrafamento na Avenida Brasil.
Assim como essa septuagenária, outras 200 mil pessoas estão inscritas no banco de dados da Secretaria municipal de Habitação do Rio, sonhando com uma unidade do PAR, projeto realizado em parceria com a Caixa Econômica.
— O fato é que nunca o momento foi tão propício para a população de baixa renda comprar uma casa — disse o Superintendente da Caixa no Rio, José Domingos Vargas.
O PAR é um plano no qual o sorteado paga taxas mensais de arrendamento, como se fosse um aluguel. No fim do contrato, que dura no máximo 15 anos, tem a opção de compra do imóvel. Após cinco anos de pagamento, as famílias podem usar o FGTS ou recursos próprios para a quitação do financiamento.
— Muitas pessoas podem ter o financiamento, mas não sabem disso. A gente mostra que elas podem ter a sua casa, em vez de pagar aluguel — disse o secretário de Habitação do Rio, Paulo Figueira.
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