quarta-feira, 12 de maio de 2010

Homem baleado em banco de SP foi vítima de racismo, diz família

07/05/2010 12h48 - Atualizado em 07/05/2010 13h26
Homem baleado em banco de SP foi vítima de racismo, diz família
Segundo mulher da vítima, não há chances de ele acordar do coma.
Família diz que não teve assistência do banco; estado de vítima é grave.
Juliana Cardilli Do G1 SP
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Domingos e a mulher, Vanda, em foto de 2008
(Foto: Arquivo Pessoal)
A mulher do aposentado Domingos Conceição dos Santos, de 47 anos,
baleado ao tentar entrar em uma agência do Bradesco na quinta-feira (6)
na Zona Leste de São Paulo, acredita que uma atitude racista possa ter
motivado o crime contra o marido, que é negro. Santos usa um
marca-passo e apresentou um documento que comprova sua condição – e a
impossibilidade de passar pela porta-giratória que bloqueia metais – ao
vigilante do banco. Após uma discussão, o segurança sacou a arma e
atirou na cabeça do aposentado. O funcionário do banco foi preso.
“Como pode um vigilante não deixar um cliente entrar no banco,
atirar em um cliente? Se fosse um loiro, podia ter gritado na agência
que entrava. Como ele é negro, grande, acharam que era um assaltante”,
disse ao G1 na manhã desta sexta-feira (7) Vanda Soranso, de 60 anos.
saiba mais
* Baleado em porta de banco foi barrado por usar marca-passo
* Vigilante de banco fere dois clientes em agência bancária após discussão
Santos foi socorrido inicialmente para o Hospital Tide Setúbal, que
é público. No local, não havia neurologista disponível para atendê-lo.
A família, então, acionou o plano de saúde. Entretanto, a remoção só
foi liberada sete horas depois.
Apesar de a assessoria de imprensa do Banco Bradesco ter informado
que está auxiliando a família, Vanda contesta. “Ninguém do banco veio
nos procurar. Eles podiam ter ajudado a fazer a remoção mais
rapidamente. Só às 17h apareceu uma assistente social do banco, que
perguntou do estado de saúde dele para o médico e foi embora. Depois,
ninguém falou mais nada”, disse a aposentada, que planeja processar o
Bradesco. A assessoria de imprensa do banco informou na tarde desta
sexta que uma assistente social acompanha a família do aposentado.
Segundo Vanda, os médicos do Hospital São Camilo, para onde a
vítima foi transferida, disseram que a demora na remoção e na
realização de uma cirurgia prejudicaram o estado de saúde já delicado
do aposentado. Ele passou por uma cirurgia na noite de quinta, e está
internado em estado grave e coma induzido. De acordo com Vanda, os
médicos disseram que seu marido corre risco de morte. “O médico
descartou a possibilidade de ele acordar. Agora é só esperar.”
Doença de Chagas
Depois de colocar o
marca-passo – necessário após a constatação de que Santos tinha a
doença de Chagas – ir ao banco se tornou mais difícil. “Às vezes
olhavam feio para ele, porque a carteirinha é só um papel com um
carimbo do hospital. Mas ele sempre conseguiu entrar. Chamavam o
gerente e eles liberavam”, conta Vanda.
Santos trabalhou como cozinheiro em uma montadora de carros até
2001. Na época, foi demitido, mas como já tinha um histórico de
convulsões, passou a receber auxílio-doença. Há dois meses, recebeu a
notícia de que havia conseguido a aposentadoria por invalidez,
definitiva.
Na casa da família, Vanda aguarda o horário de
visitas do hospital (Foto: Juliana Cardilli/G1)
Na quinta, foi pela segunda vez à agência do Bradesco, onde iria
pagar contas e sacar parte do dinheiro. No banco que costumava ir
anteriormente, ele já era conhecido e não enfrentava mais problemas.
Entretanto, o segurança disse que o aposentado não iria entrar no
banco. Ele, irritado, afirmou que entraria. Foi quando ocorreu o
disparo que atravessou a cabeça da vítima e atingiu outro cliente de
raspão.
Alegria
Segundo a família, o aposentado
estava muito feliz com a aposentadoria e planejava trocar o carro da
mulher. “Ele foi todo feliz ao banco, porque agora era um dinheiro
definitivo. Antes não dava para pensar em entrar em uma prestação”,
contou Vanda, que trabalhava em banco antes de se aposentar.
Animado, Domingos tinha se programado para passar o fim de semana
cozinhando – foi chamado pela igreja que a família frequenta para
cozinhar na festa de Dia das Mães. “Ele já ia amanhã [sábado] adiantar
o almoço. Ele sempre gostou muito de cozinhar, ficava feliz da vida, se
sentia realizado”, contou a mulher.
Casados há 28 anos, os dois moram em São Miguel Paulista, na Zona
Leste de São Paulo, próximo à agência onde ocorreu o crime. Um dos dois
filhos do casal ainda vive com os dois – Vanda também tem outras duas
filhas de um primeiro casamento. Agora, a família vai adequar sua
rotina à do hospital. Nesta quinta-feira, o plano era passar a tarde no
local para fazer as visitas à Unidade de Terapia Intensiva (UTI), na
hora do almoço e no início da noite. “A gente sempre acha que isso só
acontece na casa dos outros e vem e acontece coma gente.”

Marcio Alexandre M. Gualberto

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